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A ignorância é o maior prego Na Cruz da Exclusão

A banda de hardcore Ação Direta lançou no segundo semestre de 2019 o álbum Na Cruz da Exclusão. Gepeto, vocalista da banda, concedeu uma entrevista ao Portal Revoluta. Ele fala sobre o atual cenário político e social, o papel das bandas neste momento e as inspirações e processo de composição do novo álbum.

Por Deise Santos
Fotos de divulgação

Os álbuns do Ação Direta sempre abordam e destrincham alguma temática, dessa vez não parece ser diferente. Como vocês decidiram o que seria abordado em “Na Cruz da Exclusão”?
As inspirações para as letras, o título, as canções, tudo veio da nossa indignação, tristeza e revolta! As músicas exalam indignação, tristeza e revolta!

O álbum é um reflexo dos tempos atuais?
Sim, com certeza ! Estamos vendo e vivenciando todos esses absurdos! Transformações tecnológicas velozes, colapso social e urbano, retrocessos, perdas de direitos e apologias a torturadores, criminosos, discriminações, preconceitos. Elevados índices de violência contra minorias, descaso com educação e a propagação do fanatismo religioso aliado a politica e poder.

Nas letras é falado sobre a individualização e sitiamento do cidadão. Você acha que as pessoas estão se isolando por terem receio das polarizações, que estão cada vez mais explícitas ou você enxerga de outra forma todo esse colapso das relações sociais?
As pessoas estão sendo condicionadas a se odiarem, se desrespeitarem. Sem ao menos perceberem! Essa é a sociedade doente e falida. Uma enorme massa manobrada e inerte. Abandonada , desinformada e ignorante!
A ignorância é uma doença que traz sérias consequências!
Preconceito, machismo, discriminação racial, extremismos e tudo de ruim que possa fazer parte da natureza de um ser humano!
O que está vindo à tona é um lado sombrio da nossa sociedade, hoje propagado de forma evasiva e imediata pelas redes sociais !

Na sua opinião, qual o papel de bandas de hardcore e punk rock nesse cenário de ignorância e extremismo, onde a regressão parece ser a palavra de ordem?
Nós , como cidadãos brasileiros estamos perdendo direitos e liberdades! Os horrores da censuras, repressão e de uma ditadura cruel e assassina voltam a ecoar! Apologia a regimes fascistas e a torturadores são explicitas e surreais! Ninguém pode calar a arte! A expressão máxima do ser humano!

Você acha que esse momento de regressão pode ser benéfico como fonte para inspiração e criação de novas bandas, álbuns e movidas no cenário underground?
As bandas têm papel importante, pois tem essa capacidade de levar mensagens, informações, alternativas ao público jovem através de suas letras, de tópicos a se discutir, enfim, o HARDCORE tem um poder de transformar, dar uma identidade !

Vemos uma parte do “público rock” questionando em publicações nas redes sociais, além de alguns shows, como foi o caso do Roger Waters, sobre as bandas se posicionarem politicamente. A que você atribui essa negação de parte do público em unir música e política?
Tudo isso é fruto da polarização massiva! As pessoas são influenciadas e manobradas o tempo todo e isso reflete direto em atitudes como essas. Uma polarização burra, limitada , onde uns rotulam os outros e assim se odeiam. A maioria das pessoas não sabe o que realmente está acontecendo, aliás nem sequer sabem que não sabem!

Voltemos ao álbum: o  que significa a sigla “O.C.E.A.N.”? Tem alguma história por trás da sigla ou você quis dar uma nova roupagem para a palavra oceano? Aliás, a letra é um grito de alerta para quem compartilha tudo na rede mundial de computadores, não é mesmo?
O.C.E.A.N.* é uma sigla para mente aberta, consciente, extrovertido, amável e neurótico. Essas são as características que identificam a pessoa/produto nos grandes cruzamentos de dados realizados pelas grandes corporações. Assim são vendidos os dados de acordo com as necessidades identificadas. Dados esses que nós fornecemos gratuitamente e inconscientemente nas redes diariamente! Liberdade vigiada e direcionada.

Vocês gravaram “O Caçador da Noite” da Dorsal Atlântica. Como vocês decidiram por essa música?
Todos na banda são fãs da DORSAL ATLÂNTICA! Temos uma história com a DORSAL e fizemos alguns shows juntos na época. Quando estávamos fechando o repertório do álbum novo, o Galo, nosso baixista sugeriu essa música, que é um clássico absoluto ! Todos curtiram e toparam o desafio.
Além do desafio, tivemos o intuito de prestar essa homenagem mais que merecida. Vale a pena citar que recebemos apoio e ajuda técnica do grande Carlos Vândalo durante o período em que estávamos construindo nossa versão. O resultado ficou brutal !

Mais uma vez a arte gráfica ficou por conta do 1Berto. Como funcionou? Ele se baseou somente no nome do álbum ou vocês passaram o álbum para ele ouvir e traduzir em imagens a ideia do álbum?
O 1Berto é um velho amigo muito talentoso! O admiramos muito pela sua arte, seu estilo, sua visão e expressão! Seu estilo em preto e branco, riscado, abstrato! Ele recebeu o título NA CRUZ DA EXCLUSÃO, acompanhado de todas as músicas e letras e mergulhou na obra! Sua visão e representação estão ali e caminham juntos com as músicas.

Ultimamente as pessoas não consomem muito mais a mídia física, mas vocês fazem questão de lançar um full e com qualidade técnica e visual absurdas. Você acha que ainda vale a pena investir em álbuns físicos?
Fizemos um trabalho recente com a nossa discografia completa disponibilizada em plataformas digitais! Tínhamos essa pendência que foi resolvida. Damos importância a isso, pois é a nova realidade, o jeito que as pessoas estão ouvindo músicas hoje em dia!
Paralelamente, o novo álbum teve duas novas parcerias: a XANINHO DISCOS de Belém e a MONSTRO DISCOS de Goiânia. Eles toparam fazer uma tiragem física em formato CD DIGIPACK e tem saído muito bem. Estamos batalhando por uma edição em LP também para o futuro.

Quais os planos da banda daqui pra frente? Como está a agenda de shows?
Estamos sendo agenciados pela XANINHO DISCOS. Traçamos um planejamento e estamos trabalhando forte no momento e fazendo shows. Fiquem atentos às novidades!

E pra terminar: quem está na cruz da exclusão? Há esperança de redenção?
O refrão diz …. mais um prego batido, na cruz da exclusão…………
Mais uma ação desastrosa, mais um assassinato, mais um acidente ambiental, mais uma tragédia anunciada, mais uma violação de direitos!
As minorias, os pobres, os negros, os gays, as vítimas de homicidas, as mulheres, as crianças, as pessoas em situação de rua, o cidadão de bem! Redenção? Nesse momento estou mais inclinado ao ….. NO FUTURE!

Deixo o espaço aberto pra você deixar sua mensagem a quem leu a entrevista e acompanha vocês:
Queremos agradecer aos nossos parceiros MONSTRO DISCOS E XANINHO DISCOS por acreditarem na gente e ao público do Brasil inteiro que nos apóia! Nos vemos na tour NA CRUZ DA EXCLUSÃO.

Para saber mais sobre a Ação Direta, siga-os no Facebook .

* em inglês: O.C.E.A.N.: Openness, Conscientiousness, Extroversion, Agreeableness and Neuroticism.

Deise Santos
Carioca, jornalista, produtora cultural, baixista e guia de turismo. Deise Santos é apaixonada por música - principalmente rock e suas vertentes -, literatura, fotografia, cinema, além de colecionadora - contida - de vinis. Pé no chão e cabeça nas nuvens definem a inquietude de quem está sempre querendo viajar, conhecer pessoas e culturas diferentes. Idealizadora do Revoluta desde seus ensaios com zines, blogs e informativos, a jornalista tem como característica a persistência em projetos que resolve abraçar.
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