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Crônica de um tiozão punk rocker

2ª Edição do Rock Station com: Bad Religion + Dead Fish + Pegboy + Samiam + Teenage Bottlerocket
(Espaço das Américas – SP – 05/11/2017) 

Texto e fotos por Alexandre Bárbara

Uns meses atrás, quando a 89FM de São Paulo anunciou o line-up do Festival Rock Station deste ano, eu quase não acreditei. Era muita coisa boa junta em uma tarde/ noite só, quase aquele papo de “só acredito vendo”. Teenage Bottlerocket, Samiam, Pegboy e Bad Religion, acompanhados pelos camaradas do Dead Fish. Vai vendo.
Pois bem, lá fui eu conferir! Saí de um congresso científico em Minas e fui direto pra paulicéia conferir o festival, antes de voltar pro Rio.
São Paulo é do caralho! E também um lugar muito estranho. Chegando na porta do Espaço das Américas, na Barra Funda, onde aconteceriam os shows, os camelôs do entorno ofereciam long necks de Heineken e Bud por “módicos” 10 Reais. Chorei tanto daqui e dali que consegui a 7 pratas e me senti um vencedor de maratona. Mal sabia que mais tarde me surpreenderia mais ainda.
A entrada no local foi tranquila. Cheguei cedo porque a programação anunciava que o quarteto punk Bublegum criado nos 90 por Ray Carlisle começaria as 15:30. E pontualmente neste horário o TEENAGE BOTTLEROCKET subiu ao palco para 40 minutos de um showzaço de punk rock “ramônico”. O espaço ainda estava meio vazio, em especial a “pista pobre”, dividida por duas grades da “pista premium” (quando permitimos que estas excrescências se instalassem entre nós??). Corri para perto da grade, à esquerda, e já dei uma pirada em “Freak Out” e a sensacional “Skate or die”, as duas primeiras do show! Os caras emendavam uma na outra, sem parar, e a galera à minha volta devia me achar o tiozão mais pirado do lugar, pulando e agitando sem parar. E tome “I don’t wanna go”, “Crashing” e “In a pit” na sequência, os caras mais agitados, mais gente chegando pra curtir. Na metade do show uma corda da guitarra de Kody Templeman arrebenta (aparentemente a MI ou LÁ), logo ele, o cara dos solos. E a banda não parou, tocou mais duas enquanto o cara e um roadie tentavam trocar a corda. E eu pensando: caralho, se fosse lá no velho Garage ou no Subúrbio Alternativo, já aparecia um maluco de outra banda oferecendo uma guitarra emprestada, né? Mas o camarada ficou ali se virando com, aparentemente, sua única guitarra de tournée.
Havia visto o TB três anos atrás no Rio, tocando em um domingo para 30 pessoas no Teatro Odisséia, e eles mantém o mesmo espírito de dar tudo de si, seja para 10 ou 1000 pessoas. E com “Dead Saturday” e “Cruising for chicks” encerram o show. Ao meu lado um cara com aquele olhar chapado comenta comigo: “ê meu, não conhecia… que da hora”! É amigo, por isso vale a pena chegar cedo aos shows e ver bandas que não conhecemos.
Um rolê pelo lado de fora, com um palcão montado onde bandas selecionadas por um concurso da rádio se apresentavam (outra parada que eu considerava já extinta), papo com a galera, cervejas, e as 16:30 já estava posicionado à esquerda da grade de novo, mais ansioso ainda. O locutor da rádio entra com aquele esquemão de “animador de programa de auditório”, dá aqueles gritinhos tipo Faustão e anuncia que agora, direto de Chicago, PEGBOY! As cortinas se abrem e vejo Sergie e no meio Jason… é, era o SAMIAM no palco! Gargalhei! Jason dá boa noite e anuncia que… yeah, we’re Samiam...”, meio debochado, e já emenda “80 west”. Eu e um amigo literalmente soltamos todas as frangas e nos acabamos gritando a letra da música, nos fazendo definitivamente ganhar o prêmio “tiozão doidão rock station 2017”. Na boa, parte dessa juventude é muito “cool” pro hardcore. Todo mundo se veste bem, cabelos cuidadosamente penteados, maquiagens da moda, camisas no estilo e aquela cara de “atento pero no mucho” às bandas que não conhecem. Mas, na boa, todo mundo deveria conhecer o SAMIAM! Na música seguinte, “Sunshine”, primeira música do maravilhoso Astray, que eles lançaram em 2000, eu só pensava nisso! O Samiam foi uma banda que trouxe muita gente nos 90’s pra dentro do que era o “EMO” da época, junto com Jawbreaker, Quicksand e, mais tarde, Sunny Day Real Estate e Mineral. E tome “Mexico” e “Factory” nos deixando ainda mais EMOcionados com a performance da banda. Em determinado momento o volume do palco fica baixo DEMAIS. Estranhamos. Uma galera conversa e resolvemos cantar mais alto que eles pra conseguir trazer quem tava no esquema “vim pelo rolê”, de volta ao show. E lá vem “Dull”, com aquela letra linda, aquelas memórias de 2001, 2002, aquela sensação que a gente deveria só agradecer por haverem bandas como essa! Na parte final do show, a voz do Jason começa a falhar um pouco. Nada que parte pequena da galera não dê conta, cantando a plenos pulmões com ele “Capsized” e “She Found You”. Achei a reta final menos animada, como se a banda tivesse apostado em queimar seus melhores cartuchos no início do show. Tanto que encerram seus 50 minutos de show com “Take Care”, uma linda música que normalmente abre os shows dos californianos. O show acaba e meu terceiro encontro com o SAMIAM deixa aquele gostinho de rever alguém que você ama.
Ao contrário do que viria a seguir: encontrar pela primeira vez alguém que você sempre amou à distância. Caralho, naqueles cinquenta minutos de espera após o show do SAMIAM resolvi dar um rolê e tomar uma cerveja sozinho, e lembrar daquelas tardes na praça XV em 1996, 1997, ouvindo uma fita do PEGBOY que até gastou, que tinha o “Strong Reaction” de um lado e o “Earwing” do outro. Era a trilha sonora das sessions, era o som de cabeceira de uma galera do skate na época, era uma banda que eu jamais imaginaria ver, até porque desde 2000 acho que o Vasco foi mais vezes rebaixado que tiveram shows deles. O último havia sido há três anos atrás em um evento da gravadora Touch and Go!
Pois pontualmente as 17:40 John Haggerty manda os primeiros acordes de “Not What I want” e, sério, não me mijei de alegria porque havia bebido pouco. Caralho, era o PEGBOY ali na minha frente (tá, a alguns quilômetros de distância por causa da caralha da pista premium). O som, assim como na reta final do Samiam, segue MUITO baixo e sem pressão. Encontro um amigo do Rio que faz o mesmo comentário. (Beleza, ao menos não tô maluco sozinho).
Larry Damore é uma figuraça, um tremendo frontman, um cara que claramente ama estar ali! Quase todo o show ele canta em frente à galera do gargarejo, isso quando não manda uns stage dives de tiozão e canta no meio do povo. Povo, aliás, que é de onde ele vem, working class hero que é, trabalhando construindo barcos há décadas nos EUA, mão suja de graxa e botas!
“Field of darkness” e “Superstar” foram pra lá de emocionantes, assim como a supresa de ouvir “Dangermare”, do Cha-cha-cha demore, um dos álbuns mais esquecidos da banda. Ver John Haggerty ao vivo, fundador do Naked Raygun, também é emocionante! A história dessa porra toda que chamamos de “hardcore” estava ali, na nossa frente! E eu não me conformava com a pouca interação da galera com a banda. Mas foda-se, porque “Strong reaction” veio na sequência e quase me mata do coraçaum, puta-que-o-pareu, caralho, porra, quantas vezes na vida eu imaginei ouvir essa música ao vivo!! Foda! Em “Through my fingers” eles erram a intro, me fazendo sentir que isso SIM é hardcore: meio improvisado, meio como se estivessem tocando ali no velho casarão amarelo, se divertindo! Eles terminam 50 minutos de show e eu já podia ir embora. Saí pra área externa, suado e mais feliz que torcedor do Fluminense quando se livra do rebaixamento.
Um rolê para ver camisas de 70 reais das bandas. Sério, sessenta ou setenta pratas em uma camisa de malha?? Bem, até que tá de boa, levando em conta que a água era SEIS reais e a cerveja em lata 12, doze, DOZE, D-O-Z-E!!! Beleza, melhor que bebo pouco.
Às 19 horas, com o lugar já BEEEEM mais cheio, o orgulho do hardcore capixaba DEAD FISH sobe ao palco. Como já somos acostumados com Rodrigo, Alyand, Marcão e Rick, ficamos mais pra parte de trás. E foi bonitão ver os caras como penúltima banda, já com o som BEM, MAS BEEEEM mais alto, dominar o cenário e mandar ver naquele hardcorezão acelerado! Rodrigo tá com a língua afiada, manda vários discursos “papo-reto” que aterrorizam a coxinhada “Proto-Dória”. Achei uma tremenda escolha acertada colocar o DF neste horário, tanto em respeito à história da banda quanto pela imensa popularidade que eles têm com a galera. O público cantou TODAS as músicas com eles. Eu fiquei particularmente feliz em ouvir “MST” de volta ao set da banda. Golaço dos capixabas.
E era chegada a hora do prato principal deste banquetão hardcore. Minha nona vez com o Bad Religion, fiquei na minha, ali pelo meio da pista, pensando: “bem, já vi esses caras tanto que nada mais me surpreende deles”. TÁ, TÁ, é a banda do coraçaum, é a banda que me fez entender um zilhão de coisas, que me fez até ter vontade, lá por 1990, de aprender mais inglês. Mas, vamos lá: nada de novo. A noite já tava boa demais.
Mas daí, de novo pontualmente, as 20:30, as luzes apagam, e o Brian Baker aparece com aquele cabelinho de tiozão do forró dele, e manda aquele riff esperto de “Recipe for hate”… e daí, mermão, eu só gritei um “PUTAQUEOPAREEEEEEEU” e me joguei naquela roda pra ser feliz!! Era o Bad Religion mais uma vez me fazendo perder a linha e me lembrando porque amo tanto esses californianos desgraçados!!
E lá vem uma tríade do “Process of Belief”, disco de retorno do Brett em 2001: “Supersonic”, “Prove it” e Can’t stop it”. Aliás, pequenas sequências de álbuns da banda seriam a tônica da noite. Mas antes disso teve “Anesthesia”, que me fez lembrar dos amigos da banda “True North”, que criamos pra tocar em um “Bad Religion Day” aqui no Rio. E a surpresa da noite, “Streets of America”, do The Gray Race, que muita gente claramente não conhecia. Os caras tão super à vontade  e Graffin anuncia que o álbum No control completa, em breve, 30 anos de lançamento (na real, só em 2019, né…). E emendam cinco, CINCO músicas deste disco, começando com “Change of ideas”, a primeira do disco. CARALHO! E tome “Big Bang”, “Henchman” (em que eu fiz “Alôka”), “Sanity” (Porra Marcelo, lembrei pra caralho de você!!) e a já clássica “No control”. Gente, sério: chama o SAMU porque eu morri!
Mas segura, que mais à frente o Jay Bentley começa uma música sozinho com uma linha de baixo… e lá vem “Against the grain”. Maluco, sério, saporra devia ser proibida!!! Me agarro em uma conhecida e cantamos a letra toda como se nossa vida dependesse disso! Que música!! Acho que em 1999 eles haviam começado um show no Rio com esse som. Depois disso, nunca mais. E eu pensei: bem, AGORA acabou né?
Mas daí de novo o beberrão do Bentley se aproxima do microfone e começa a sussurrar: “delirium… of disorder…”. Bem. Essa música. “A” música que me fez amar de cara o BR, lá pelos idos de 1989. E eu nem consegui agitar. Passei o minuto e meio dela parado, tentando segurar as lágrimas de saudade do meu irmão e cantando aquela letra, desejando que metade do público entendesse a letra.
(Pausa after pieguice, voltamos à programação normal).
“Atomic Garden” e “Come Join us” em sequência abrem a parte final do show, anunciando que dali em diante seria só SU-CES-SO! E lá vem aquela introdução bisonha e brega de “Generator” à capela, que eu só quero que eles esqueçam (toquem a porra da música como ela é, ô seus canalhas imperialistas!!). Na sequência, “You”, “Infected” e “Sorrow” dão números finais à destruição catártica do BR.
Mas claro que depois daquele cú doce de lei, eles ainda retornam para mandar “Punk rock song” (confesso que amo o Jay cantando a parte de “one in five kids below the poverty line”), “Fuck Armaggedon” e encerram com… com …adivinha???
Alguém adivinhou???
Claro! “American Jesus” põe a juventude pra se acabar, enquanto eu penso o quanto esses caras são uma das poucas bandas contemporâneas “quase” mainstream que tem coisas a dizer.
Mais uma vez irritantemente pontualmente as 22 horas, o show acaba. As luzes acendem e, no caminho da saída, ainda encontro Jason, vocal do SAMIAM, no meio da galera. Troco uma ideia rápida com ele (que estava ali sem que ninguém o reconhecesse), agradeço por tantos anos de boa música e saio pela chuva paulistana com aquele sorriso no rosto de quem acabou de achar cinquenta reais no chão. Tão feliz que até tomei uma cerveja de dez reais na porta!
Que noite!

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