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Questions: novo álbum tem discurso direto, alto e em português

Foto por Luiz Trezeta

A banda de hardcore Questions acaba de lançar o álbum Libertatem!, disponível para audição em diversas plataformas digitais. E, para saber um pouco mais sobre a concepção e construção deste novo álbum, bati um papo com o guitarrista Pablo Menna. O resultado é uma reflexão sobre o momento político mundial e a necessidade de deixar a mensagem da banda, que passa pelo enfrentamento e defesa dos direitos das minorias, mais clara e direta, como o hardcore deve ser.
Confiram a entrevista.

Por Deise Santos
Fotos por Luiz Trezeta e Pedro Henrique

Como vocês decidiram gravar um álbum em português?
Essa é uma ideia que a gente comentava faz muito tempo, mas a coisa começou a tomar forma mesmo depois do golpe de 2016, quando a situação política do país degringolou de uma maneira que a gente não esperava e a polarização tomou conta de vez.

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A gente achou que tava na hora de deixar ainda mais clara e mais enfática a nossa mensagem, que é basicamente de respeito aos direitos humanos em geral, principalmente das minorias e das classes mais sofridas do nosso povo. Assim, fizemos e lançamos uma primeira música, “Lutar”, em 2017. Não temos vergonha de dizer que encaramos isso como um desafio bem difícil, a gente não sabia se ia sair com a nossa cara e se ia soar bem. Como a gente gostou do resultado e a situação do país de lá pra cá só piorou em todos os sentidos, sentimos que era a hora de fazer um álbum inteiro em português. Então passamos 2018 compondo e gravando as músicas, e o resultado, o disco “Libertatem!”, tá na rua agora.

O novo álbum, apesar de ter algumas passagens mais melódicas, mostra um Questions mais pesado do que antes. A que isso se atribui?
Esse disco tem sim algumas novidades na sonoridade, a gente quis colocar mais alguns detalhes nas músicas, algumas melodias. Isso não tem a ver com tentar deixar a banda “mais acessível”, mas sim com a gente querendo experimentar coisas novas pra não fazer exatamente o que já fizemos antes. Assim, achamos que conseguimos abrir mais portas para o nosso som, mas sem perder as nossas características. Somos uma banda de hardcore, crescemos ouvindo e adoramos tocar som pesado. E agora temos uns detalhes a mais.
Uma contribuição fundamental para o disco ter saído como saiu é a produção da galera do estúdio Toth, Danilo Souza e Fernando Uehara. Além da mix do Gabriel Zander e a master do Alan Douches.

Vocês diriam que o nome do álbum é um resumo da trajetória do Questions até aqui?
Queríamos um nome que marcasse essa mudança de língua e algo que representasse as coisas nas quais a gente acredita. O Edu (vocal) veio com a ideia de uma palavra em Latim, a língua mãe do português, e achamos que tinha tudo a ver. Libertatem quer dizer liberdade, uma palavra que pode significar muitas coisas mas que, para nós, é fundamental e cada vez mais necessária nesses tempos sombrios que estamos vivendo. O ideal de liberdade é uma ideia que não podemos abandonar, devemos lutar por ela sempre. E como você falou, tem a ver também com a nossa história também, porque essa banda é uma forma que encontramos de criar um ambiente em que fazemos só o que achamos que devemos fazer, sem pressão de ninguém a não ser de nós mesmos.

Vocês acreditam que as letras em português vão aproximar mais o público e trazer mais gente pra linha de frente do Questions?
A gente acha que fica mais fácil pra galera assimilar e já estamos sentindo essa resposta nesses poucos dias em que o disco foi pra rua. Não vemos a hora de ver isso de perto nos shows!

Século XXI chegou e na sina de termos uma história cíclica, vimos a direito emergindo novamente. Qual o papel de bandas como o Questions nesse momento?
Nosso papel e o da música underground em geral é o que sempre foi: dar voz às injustiças, transformar a raiva que sentimos por tantas coisas erradas à nossa volta em energia para enfrentar o dia a dia. O hardcore é, por princípio, inconformado e contestador. O que é completamente inacreditável pra nós é que não é a “direita” que ganhou as eleições e está no comando do país, mas sim uma extrema direita rancorosa, com um discurso aberto de violência. Não dá para entender como esse tipo de coisa ainda tenha espaço, não só no Brasil, como em vários lugares dos mundo. E o que é pior ainda, é que uma parte considerável da população apoia. Acreditamos que nesse momento a nossa mensagem é ainda mais necessária do que antes.

Vocês tem um histórico de tocar na Europa, inclusive em países onde outras bandas não costumam incluir em seus roteiros de tour europeia. Como vocês acham que vai soar um álbum em português para o público desses países (leste europeu, por exemplo)?
Boa pergunta. Honestamente, não sabemos como a galera vai receber o disco. O que podemos dizer é que muitas vezes nessas viagens vieram nos perguntar porque a gente não cantava na nossa própria língua. Temos certeza que muitxs lá têm a cabeça aberta e vão se interessar pelas letras, procurar a tradução, etc, porque isso é parte da cultura. Geralmente a galera se mostra mais interessada nessas coisas do que aqui. Já recebemos um retorno de umas pessoas que curtiram e um motivo de muita satisfação para nós é que dois selos alemães (Toanol Records e Underdogs Record) vão lançar o disco em cd e vinyl, além de um terceiro selo (Mustard Mustache) que vai lançar em cassete. A música é uma linguagem muito foda por causa disso, quebra barreiras que parecem muito difíceis de quebrar. Quem se identifica com a banda pode curtir mesmo que não entenda de primeira as palavras, é nisso que acreditamos.

Vocês estão preparando as malas para fazer uma tour pelo México. Isso já vinha sendo planejado? Contem um pouco sobre a proximidade que vocês têm com a cena mexicana.
O México é um sonho antigo que acabou não rolando antes porque até agora sempre concentramos nossos esforços para viajar indo para a Europa, onde é possível fazer tours por um mês. Ai surgiu o convite para tocar no Off Limits, um festival muito louco que rola na Cidade do México. Aproveitamos para marcar o maior número de datas possível, vão ser 7 shows. Ao longo dos anos a gente manteve contatos com algumas bandas de lá, mas nunca tinha surgido a chance de tocar, por isso estamos super empolgados! Vai ser uma grande experiência, temos certeza!

Num mundo globalizado, onde fronteiras estão sendo levantadas, em nome do racismo e da intolerância, o Questions cerra o punho e apoia as minorias. Vocês dialogam com coletivos e grupos para contribuir de uma forma mais efetiva com essas lutas?
Nós expressamos as nossas ideias e tentamos apoiar a causa das minorias mais através da nossa música e da nossa postura. Apoiamos as pessoas próximas e seus coletivos/bandas/projetos, trazendo a maior diversidade possível para o festival que a gente organiza desde 2001, o SPHC fest. Fazemos questão de que os nossos shows sejam um ambiente de inclusão para todo mundo que se identifica com essas lutas.

E, complementando, o Libertarem foi, de certa forma, produzido para essas minorias?
De certa forma sim porque há movimento muito forte de repressão à tudo que esteja fora do padrão do dito “cidadão de bem” branco, heterosexual, de religião e valores morais “certos”. Nós somos diferentes, exigimos respeito e não vamos nos enquadrar. E queremos somar forças com quem também tem esse espírito de liberdade. Lutar para sermos livres não é bagunça, pelo contrário. É reconhecer e respeitar as diferenças, é a busca por conviver de maneira pacífica e respeitosa com quem não é igual a você. Não podemos falar pelas mulheres ou pela causa lgbtq+, por exemplo, mas podemos mostrar a nossa solidariedade. E nós viemos da periferia, convivemos de perto com um monte de injustiças e nos identificamos com a causa de todos aqueles que lutam pra conquistar os seus direitos.

Novos tempos exigem novas formas de divulgar o material. Vocês promoveram uma festa para lançar e fazer a primeira audição do álbum (não um show, mas uma audição), como foi essa experiência?
Foi demais, muito gratificante! Na real a ideia da festa surgiu porque antes do disco sair sempre vinha alguém perguntar como é que tava o som, a curiosidade pelo português e tal. Além disso, já tinha faz tempo o convite do FFFront, uma casa que gostamos muito, para fazer algo lá. Então resolvemos fazer esse rolê para quem estivesse a fim de ouvir o disco e comemorar esse momento com a gente. Na parte de cima do bar, ficou passando no telão um lyric video com o disco inteiro (em breve vai pro youtube) pra galera conferir. Muitxs amigxs do hardcore, do skate, de vários rolês diferentes colaram, o que foi uma honra pra nós! Além de figuras que admiramos muito como o Ariel Invasor (que participa do nosso disco) e a Tina, o Girão da Tribo, o Pirata eterno Anjo dos Becos…. e por aí vai.

Qual a previsão do Questions cair na estrada, aqui no Brasil, para promover esse álbum?
Sim, com certeza! Depois da tour no México já temos vários shows marcados por várias cidades do Brasil. Queremos dividir essas músicas e essa nova fase da banda com o máximo de pessoas possível. Agora que o disco tá na rua é sair pra tocar! Fiquem ligados na nossa agenda para não perder as datas https://www.facebook.com/QuestionsHC.

Ouça o álbum!

Deise Santos
Carioca, jornalista, produtora cultural, baixista e guia de turismo. Deise Santos é apaixonada por música - principalmente rock e suas vertentes -, literatura, fotografia, cinema, além de colecionadora - contida - de vinis. Pé no chão e cabeça nas nuvens definem a inquietude de quem está sempre querendo viajar, conhecer pessoas e culturas diferentes. Idealizadora do Revoluta desde seus ensaios com zines, blogs e informativos, a jornalista tem como característica a persistência em projetos que resolve abraçar.
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